UM AUSENTE





Tenho razão de sentir saudade, tenho razão de te acusar. .




Houve um pacto implícito que rompeste .




E sem te despedires foste embora. .




Detonaste o pacto. Detonaste a vida geral, .




A comum aquiescência de viver .




E explorar os rumos de obscuridade, .




Sem prazo, sem consulta; sem provocação, .




Até o limite das folhas caídas na hora de cair. .




Antecipaste à hora. Teu ponteiro enlouqueceu, .




Enlouquecendo nossas horas. . Que poderias ter feito de mais grave .




Do que o ato sem continuação, o ato em si, .




O ato que não ousamos nem sabemos ousar... .




Por que depois dele não há nada? .




Tenho razão para sentir saudade de ti, .




De nossa convivência em falas camaradas, .




Simples apertar de mãos, nem isso, .




Voz modulando sílabas conhecidas e banais, .




Que eram sempre certeza e segurança. .




Sim, tenho saudades. .




Sim, acuso-te porque fizeste o não previsto .




Nas leis da amizade e da natureza .




Nem nos deixaste sequer o direito de indagar .




Porque o fizeste, porque te foste.




(Carlos Drummond de Andrade)

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